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Histórico XXII Governo - República Portuguesa Voltar para Governo em funções

Intervenções

2022-03-23 às 13h43

Intervenção da Ministra da Cultura na atribuição da Medalha de Mérito Cultural a Maria do Céu Guerra, João Lourenço, Luis Miguel Cintra e, a título póstumo, Jorge Silva Melo

«Acredito que hoje não é um dia igual a tantos outros. Aqui, nesta sala, celebramos algo que é urgente celebrar: o trabalho de quatro pessoas que dedicaram toda a sua vida à arte e à cultura e que, fiéis aos seus ideais e sonhos, com ousadia, risco e esperança, construíram novos futuros para um país que é o nosso. 

Não é também por acaso que nos encontramos aqui, desta forma. Este palco e esta sala, onde nos juntamos em partilha e comunhão necessária e imprescindível, são afinal a síntese do que é e deve ser o Teatro: a certeza de que não podemos viver uns sem os outros.

Este é também  o dia em que valorizamos a memória e o papel do tempo. E é essa a razão primordial pela qual o Ministério da Cultura homenageia hoje quatro artífices maiores do universo teatral português: Maria do Céu Guerra, João Lourenço, Luis Miguel Cintra e, a título póstumo, Jorge Silva Melo. 

Esta cerimónia conjunta privilegia, assim, uma ideia de coletivo, antevendo a lógica que presidirá, a partir de 2022, à realização anual das «Comemorações do Mérito Cultural», o que acontecerá a 7 de junho. Sublinhamos, deste modo, uma ideia central: a de que, nas suas individualidades, estas figuras têm contribuído, ao longo dos anos, para criar uma argamassa comum que os une e nos une a elas: a de uma arte feita verdade natural, rente à pele e à vida, intensamente vivida, que não se rende à geometria do mundo. 

Porque o teatro não é uma arte solitária. É a afirmação fervorosa de um ritual coletivo nos bastidores, no palco e na plateia. É o diálogo com o outro como ausência de ódio. É a celebração de uma respiração compartilhada e de uma energia empática que nos são vitais.

Mas o teatro é também um ousar necessário e um salto inquietante para o desconhecido. É precisamente por isso que ele continuará vivo e a pulsar: porque não podemos rasurar o pensamento divergente. E porque o teatro é um lugar de interrogação do mundo, uma arte da dúvida mais fascinada com as perguntas do que com as respostas, uma arte que renasce sempre, pois não deixa de ser uma convenção que temos constantemente de abolir. Assim têm vivido as suas vidas aqueles que hoje homenageamos.

Celebramos aqui, no  palco deste teatro nacional, o papel fundamental do teatro independente e dos seus muitos e valorosos protagonistas. Um ato simbólico que reflete também a convicção, por esta tutela, de que os teatros nacionais, sem descurar as suas identidades programáticas, têm sido cada vez mais vez salas abertas ao mundo e à pluralidade de perspetivas e abordagens que não apenas as urdidas entre as suas quatro paredes. 

Falo de lugares de liberdade, temperados pela diferença e tolerância, lugares que cimentam e aprofundam a democracia. Lugares que queremos multiplicar, promover, valorizar e apoiar – de que a aposta na Rede de Teatros e Cineteatros Portugueses criada este ano é, de resto, um exemplo ilustrativo. 

Maria do Céu Guerra, João Lourenço, Luis Miguel Cintra e Jorge Silva Melo são figuras referenciais – e reverenciais, porque não? – das artes performativas em Portugal, os quais, através sobretudo dos seus projetos culturais-âncora – A Barraca, o Novo Grupo/Teatro Aberto, o Teatro da Cornucópia e os Artistas Unidos –, influenciaram e continuam a moldar várias gerações de profissionais da cultura. 

Os quatro agraciados, todos eles nascidos na década de 40, integram uma plêiade carismática de encenadores que, fruto da sua longevidade, coerência e resiliência, marca decisivamente as rotas do teatro português contemporâneo a partir dos anos 70 do século XX até aos nossos dias. Estamos perante trajetos e obras marcantes, que juntam a potência criativa do palco à vibração da assembleia humana que o teatro singularmente convoca.»

Leia a intervenção na íntegra.

Tags: teatro